A história dos alimentos extrusados para cães e gatos tem mais 70 anos. Estes alimentos vieram para trazer praticidade na vida dos tutores e ao mesmo tempo uma nutrição descomplicada e segura para os pets, pois passou a ser possível reunir em um único alimento todos os nutrientes necessários para garantir a boa saúde dos animais. Com a produção em maior escala, foi possível atender mercados mais distantes e para isto era necessário garantir a qualidade dos produtos por períodos maiores.

Os dois maiores riscos durante a vida de prateleira de alimentos são a contaminação microbiológica e a oxidação. No caso dos alimentos secos, a contaminação microbiológica apresenta menor risco, pois estes alimentos apresentam uma atividade de água (aw) mais baixa do que a favorável ao crescimento de leveduras, fungos e bactérias. Por outro lado, o risco de oxidação é eminente e, quando ela ocorre, as consequências são perdas na palatabilidade, perdas vitamínicas e de ácidos graxos essenciais (ômegas 3 e 6) e formação de compostos potencialmente tóxicos, comprometendo a nutrição completa e saudável do animal. Por esta razão, os antioxidantes são usados em alimentos para humanos e animais que tenham uma vida de prateleira mais estendida, como é o caso de pet food.

Mas afinal, o que são os antioxidantes?

Antioxidantes, sejam eles naturais ou sintéticos, são aditivos que, quando adicionados em pequenas quantidades em relação a um substrato oxidável, preservam o alimento da oxidação durante o processamento e estocagem do produto (Wilson et al., 2017). Desde o início da produção de alimentos extrusados, os antioxidantes sintéticos têm sido empregados em pet food. São exemplos destes compostos o Etoxiquim, BHA, BHT, TBHQ e galato de propila, entre outros. Alguns, como o etoxiquim, já deixaram de ser usados em algumas localidades, como a Europa e a América do Norte, mas outros como o BHA e BHT são extensivamente utilizados pela indústria de alimentação humana e animal no mundo todo. Sua utilização é permitida e são reconhecidos como seguros por agências internacionais que controlam a segurança dos alimentos (EFSA, 2018; EFSA, 2022) há mais de uma década. Apesar disso, tem sido constante a busca por compostos naturais, no contexto da humanização do segmento pet food, visando atender as demandas dos consumidores, com a utilização de compostos naturais e saudáveis.

Neste contexto, inúmeros antioxidantes naturais estão disponíveis para a preservação de pet food atualmente, e a indústria tem buscado substituir gradualmente os antioxidantes sintéticos por naturais no desenvolvimento de produtos naturais. Os principais antioxidantes naturais atualmente empregados são os extratos de alecrim, chá verde, orégano, mix de tocoferóis, entre outros.

Oxidação Lipídica em pet food e a necessidade de emprego dos antioxidantes

A oxidação lipídica em produtos alimentares é um dos desafios mais críticos da tecnologia de alimentos. Isso porque compromete o sabor e o aroma dos produtos e reduz significativamente sua qualidade nutricional. Além disso, a oxidação pode levar à formação de compostos tóxicos, que impactam na saúde dos animais e prejudicam a segurança dos alimentos (Tsai et al., 2005). Para a indústria de pet food, essa é uma preocupação não apenas em termos de palatabilidade, mas também de preservação de nutrientes essenciais, como vitaminas e ácidos graxos ômegas-6 e ômegas-3.

A oxidação lipídica é um processo complexo que ocorre quando gorduras e óleos entram em contato ou são submetidos a quaisquer um destes componentes: oxigênio, calor, presença de radicais livres, luz, pigmentos e metais de transição (Laguerre et al., 2007). Isso ocorre tanto em fontes vegetais quanto animais. Existem três formas principais de oxidação:

A autoxidação é a forma mais comum de oxidação em pet food, e apresenta 3 estágios (iniciação, propagação e terminação), os quais estão ilustrados na Figura 1. Em resumo, na fase de iniciação, são pouco perceptíveis as alterações, pois as perdas nutricionais ainda são pequenas e os compostos formados pela oxidação ainda se encontram em baixas concentrações. Quando o alimento está protegido com antioxidantes, a fase de iniciação é um período longo, pois os antioxidantes são consumidos para proteger o alimento.

Quando as reservas antioxidantes do alimento estão reduzidas, a oxidação entra na segunda etapa, de propagação. Nesta fase, o aumento nos marcadores de oxidação primários (peróxidos) e secundários (aldeídos, cetonas, álcoois, etc) aumentam em uma escala exponencial, assim como as perdas nutricionais são significativas nesta fase (ácidos graxos e vitaminas), tornando o produto inviável para o uso e as modificações organolépticas são perceptíveis. Portanto, a proteção dos alimentos objetiva impedir que a oxidação atinja esta segunda fase. Na fase de terminação, o alimento apresenta-se rançoso, com valor nutricional alterado e odor característico, que geralmente é rejeitado pelo animal, e ainda apresenta produtos finais da oxidação, que podem causar prejuízos a saúde, como oxidação no próprio organismo ou inflamação crônica (Del Ré & Jorge, 2012). Por esta razão, a preservação da oxidação é fundamental.

Uma vez que a oxidação é um processo dinâmico, desde que haja presente qualquer um dos fatores desencadeantes, a adição de antioxidantes então torna-se essencial na formulação, impedindo a progressão da oxidação e garantindo maior estabilidade e qualidade ao longo do shelf life, a qual em pet food comercializado em território nacional geralmente é estabelecida entre 12-18 meses.

A proteção de um alimento contra a oxidação vai além do uso de antioxidantes. As principais medidas são: reduzir o contato com o oxigênio, alcançada por meio de embalagens com barreiras eficazes; o armazenamento em temperaturas abaixo de 30°C, que contribui para retardar reações químicas que comprometem a qualidade do alimento; estocar ao abrigo da luz para evitar a fotoxidação. Outro fator relevante na prevenção da oxidação é o controle da presença de metais de transição e metais pesados, como cobre, ferro, cobalto e cromo, que atuam como catalisadores na degradação dos lipídios. Neste sentido, o uso de minerais na forma de quelatos, ou orgânica, favorecem a preservação dos alimentos (Silva et al., 2024). A utilização de antioxidantes, desta forma, sejam eles naturais ou sintéticos, complementa essas estratégias, estabilizando os compostos lipídicos e prolongando a vida útil do alimento. Dessa forma, a estabilidade oxidativa dos produtos pet food não depende exclusivamente dos antioxidantes, mas sim de um conjunto de medidas que mantêm a qualidade nutricional e sensorial dos alimentos, garantindo sua segurança ao longo do shelf life.

Por que utilizar antioxidantes naturais?

Os antioxidantes sintéticos, como BHT e BHA, têm sido utilizados há muito tempo pela indústria pet food devido à sua eficiência, estabilidade e segurança comprovada quando utilizados corretamente. No entanto, eles não oferecem benefícios secundários e são derivados de processos químicos que nem sempre estão alinhados às exigências atuais dos tutores e à demanda do mercado. Desta forma, os antioxidantes naturais têm ganhado cada vez mais espaço.

A substituição se dá pelo fato dos antioxidantes naturais serem extraídos de fontes vegetais e produtos agroindustriais, como alecrim, chá verde, tomilho, orégano e frutas ricas em polifenóis, que por sua vez desempenham um papel duplo na nutrição pet, que vai além de preservar os alimentos contra a oxidação, mas também podem oferecer benefícios à saúde dos animais pela prevenção do estresse oxidativo, com possíveis impactos na saúde e longevidade.

Outra razão para o uso dos antioxidantes naturais, está relacionada aos aspectos de sustentabilidade, pois estes compostos são provenientes de fontes vegetais, renováveis, enquanto antioxidantes sintéticos geralmente são produzidos a partir de derivados do petróleo, portanto, não renováveis. Além disto, antioxidantes naturais, em sua grande parte trazem “claims” importantes para pet food, pois são muitas vezes provenientes de produções orgânicas, não transgênicas e resultantes do reaproveitamento de coprodutos industriais, tais como os tocoferóis extraídos a partir de subprodutos da produção de soja, uva, entre outros, que contribuem para uma economia mais circular.

Como discutido anteriormente, a substituição dos antioxidantes sintéticos pelos naturais é impulsionada por fatores como sustentabilidade, benefícios à saúde e aceitação do mercado. Alguns dos efeitos positivos e limitações desses dois tipos de antioxidantes, encontram-se na Tabela 1.

Conforme colocado na Tabela 1, ainda são escassas as informações científicas sobre a estabilidade térmica dos antioxidantes naturais, e as concentrações ótimas para proteger os alimentos com o uso destes antioxidantes têm sido aos poucos estabelecidas. Desta forma, atualmente tem sido empregado o conceito do híbrido na preservação dos alimentos contra a oxidação, pela mescla de antioxidantes sintéticos com os naturais, garantindo uma vida de prateleira mais prolongada, pois há uma sinergia nos mecanismos de ação de ambos.

Os principais antioxidantes naturais são divididos em quatro grupos, sendo eles:

 • Ácidos Fenólicos

 • Diterpenos Fenólicos

• Flavonoides

• Óleos Voláteis

Cada um desses grupos possui propriedades únicas que beneficiam a saúde animal e a preservação dos alimentos. Atualmente, os mais empregados são o extrato de alecrim, extrato de chá verde, mix de tocoferóis e óleos essenciais.

Os tocoferóis, conhecidos como vitamina E, são representados por oito principais isômeros, sendo alfa, beta, gama e delta os principais. São antioxidantes lipossolúveis que protegem as membranas celulares e ajudam a prevenir a rancidez em alimentos processados.

O extrato de alecrim é rico em ácido rosmarínico e outros compostos fenólicos, oferecendo propriedades antioxidantes e antimicrobianas que prolongam a vida útil dos produtos.

O extrato de chá verde contém catequinas, que são potentes antioxidantes capazes de neutralizar radicais livres, contribuindo para a estabilidade dos alimentos.

Além disso, os óleos essenciais, como os de orégano, tomilho, cúrcuma e cravo, são fontes ricas de antioxidantes naturais. Esses óleos não apenas proporcionam sabor, mas também ajudam a inibir a oxidação lipídica e a degradação, oferecendo uma alternativa eficaz e saudável aos conservantes sintéticos em produtos alimentícios.

Esses antioxidantes têm demonstrado efeitos semelhantes aos sintéticos na preservação de pet food, com as vantagens citadas anteriormente. O extrato de alecrim é o antioxidante natural mais extensivamente estudado e os estudos mostram que seus componentes apresentam estabilidade térmica, uma das preocupações com o uso de antioxidantes naturais em pet food, devido às elevadas temperaturas de processo (Liu et al., 2022; Cedeño-Pinos et al., 2022). Desta forma, tem sido cada vez maior a utilização dos antioxidantes naturais em pet food.

Em um estudo recente realizado pela Special Dog Company, um mesmo alimento foi estabilizado com antioxidantes sintéticos (um blend de BHA e BHT) ou naturais (um blend de extrato de alecrim e mix de tocoferóis), constituindo dois tratamentos. Os alimentos foram mantidos a temperatura de 37°C por 180 dias, o que equivale a pelo menos 18 meses de vida de prateleira. Como resultados, ambos se mantiveram estáveis quanto aos níveis de marcadores de oxidação (índice de peróxido e compostos voláteis) e com perdas inferiores a 5% dos ácidos graxos essenciais omegas-6 e omegas-3. Outro achado importante foi que durante todo este período, as concentrações dos antioxidantes sintéticos e naturais mantiveram-se em níveis que garantem a estabilidade do alimento, com perdas muito semelhantes, a qual demonstra a estabilidade dos tocoferóis durante a vida útil de pet food. Os resultados discutidos estão demonstrados nos gráficos 1 e 2:

Fonte: Dados internos Special Dog Company.

A transição para antioxidantes naturais na nutrição pet representa uma evolução significativa na indústria de alimentos para animais, alinhando-se às crescentes demandas por produtos naturais, funcionais e sustentáveis. Os extratos de alecrim, chá verde, tocoferóis e óleos essenciais emergem como alternativas eficazes e benéficas. Esses antioxidantes não apenas preservam a qualidade e a segurança dos alimentos, mas também oferecem potenciais benefícios à saúde dos animais, como a prevenção do estresse oxidativo. Além disso, a utilização de compostos de origem vegetal contribui para práticas mais sustentáveis e responsáveis, promovendo uma economia circular.

AUTORES: 

Patrick dos Santos Lourenço - Zootecnista (UEM/Maringá), Mestrando com ênfase em avaliação de exigências nutricionais e de alimentos para animais, com foco especial em nutrição de cães e gatos, pela Universidade Estadual de Maringá (UEM).

Ricardo Vasconcellos - Mestrado e doutorado em Medicina Veterinária pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Campus Jaboticabal (2003-2008). Pós-doutorado pela mesma Instituição (2008-2010), com foco em Nutrição de Cães e Gatos. Professor adjunto da Universidade Estadual de Maringá, desde 2012. Coordenação de curso de graduação (Medicina Veterinária da Faculdade Ingá - 2012). Coordenação de curso de pós-graduação (Programa de Pós-graduação em Zootecnia da UEM - 2017-2019). Docente em cursos de graduação em faculdades particulares (UVV - 2010; FACVEST - 2011; UNINGÁ - 2012) Experiência na indústria de Nutrição Animal (Perdigão Agroindustrial - 2007-2008) Atua profissionalmente nas áreas de Medicina Veterinária e Zootecnia, com ênfase em Nutrição e Nutrição Clínica de cães e gatos e Alimentação Animal Temas de atuação: Nutrição de cães e gatos, vida de prateleira de alimentos e qualidade de farinhas e óleos de origem animal.

CO-AUTORES: Time técnico cientifico de Pesquisa e Desenvolvimento da Special Dog Company.