Explicamos o que são probióticos, a diferença entre eles e os efeitos do seu uso na alimentação animal.

Os probióticos são bactérias ou leveduras, vivas, de diferentes cepas, que podem ser acrescentadas à alimentação humana ou animal. A melhor colonização transitória ocorre com micro-organismos (MOOGs) como as bactérias láticas, que, em sua maioria são isoladas do trato gastrointestinal de mamíferos e, por isso, têm neles a sua melhor condição de crescimento e adaptação (desde que sobrevivam ao processo térmico e às etapas de digestão anteriores à sua chegada no intestino).

Os gêneros Lactobacillus, Bifidobacterium, e Streptococcus, por exemplo, são bactérias láticas que colonizam o trato gastrointestinal e atuam por exclusão competitiva aderindo-se por meio de fímbrias às células do epitélio intestinal, assim como aos principais patógenos. Os poucos alimentos pet que contém probióticos no mercado se restringem ao uso de Bacillus sp e leveduras (Saccharomyces cerevisiae), por serem considerados micro-organismos mais resistentes ao processo de extrusão. No entanto, são micro-organismos não colonizadores, que apenas transitam pela luz intestinal juntamente com o conteúdo alimentar e não se aderem ao epitélio.

Benefícios

Os probióticos possuem ampla aplicação na clínica veterinária a partir dos efeitos primários imunomoduladores benéficos para a microbiota intestinal (figura 1). Exercem efeito biológico, promovendo ambiente de baixa tensão de oxigênio, impedindo o crescimento de microrganismos patogênicos, principalmente do gênero Salmonella spp. Também possuem efeito químico, produzindo ácidos orgânicos que irão reduzir o pH do lúmen intestinal, de forma a inibir a atividade de bactérias maléficas (como Clostridium perfringens). Também propiciam o desenvolvimento de micro-organismos benéficos (como o Lactobacillus). Probióticos podem também produzir bacteriocinas, que inibem o desenvolvimento da Salmonella, Escherichia coli e Staphylococcus, combatendo patógenos causadores de doenças.

1. Efeitos da utilização de probióticos na alimentação de cães e gatos

Qual a dosagem ideal?

A ação probiótica relatada na literatura foi observada com suplementações de 107 a 109 CFU/dia única ou multi-cepas, por um período mínimo de 4 dias. Estudos mostram que, nessas dosagens, os gêneros Bifidobacterium e Lacticaseibacillus podem auxiliar na modulação da microbiota através do aumento da população de bactérias ácido lácticas durante a aplicação e redução da população de Clostrídium ssp e parcialmente de alguns gêneros de bactérias Gram-negativas. Além disso, estudos demonstram melhora da qualidade fecal e modulação do sistema imune, como aumento de imunoglobulina, neutrófilos, monócitos e hemoglobina em cães e gatos.

Relação Humana x Pet

Os prescritores da área humana frequentemente utilizam como base guias clínicos, que são materiais desenvolvidos para traduzir as evidências científicas e auxiliar na tomada de decisão clínica. O “Clinical Guide to Probiotic Products Available in Canada, 12th edition, 2020”, por exemplo, expõe uma atualização sobre o uso e dosagens de cepas probióticas frente a quadros clínicos de relevância na área da saúde. Em sua maioria, as recomendações consideram bactérias láticas. Além disso, a lista positiva de probióticos da ANVISA conta com 19 itens (entre micro-organismos isolados e associações). Enquanto apenas 3 são bacillus, os outros 16 itens são compostos de bactérias láticas. Quanto à alimentação humana, pode-se encontrar nos mercados produtos suplementados com probióticos vendidos sob a forma de leites fermentados e iogurtes. Logo, quando optamos por um suplemento com probióticos, temos mais chances de nos depararmos com bactérias láticas nas gôndolas.

Por sua vez, é importante ressaltar que o estudo da microbiota de cães e gatos pode ter influência também na saúde humana, devido à relação cada vez mais próxima entre tutores e animais de estimação. Não só a suplementação dietética contribui para a modulação da microbiota, mas também nosso entorno, pois os indivíduos com que interagimos também podem moldar nossas comunidades microbianas. Um estudo realizado por SONG e colaboradores (2013) observou que tutores de cães compartilharam mais bactérias com seus cães do que com cães de outros tutores, principalmente na microbiota da pele.

Desafios de aplicação na indústria

Existem diversos desafios na indústria de pet food quanto à aplicação de probióticos.  Dentre eles, temos a complexidade da cadeia produtiva e respectivos processos (de mistura, pré-cozimento, extrusão e secagem), que podem atingir temperaturas de 140°C, inativando assim os micro-organismos em sua forma natural.  Quando se trata de desafio, nosso foco como pesquisadoras e nutricionistas é fazer com que esses MOOGS cheguem viáveis ao intestino dos pets, e para isso precisamos ir em busca de proteção contra possíveis danos mecânicos, altas temperaturas, ácidos estomacais, biliares e enzimas digestivas. Um ponto importante é considerar que cada linha de produção é única (diferentes tempos de mistura, energia mecânica aplicada na extrusora, temperatura de secagem), assim como também existem particularidades intrínsecas à formulação (diferentes composições de ingredientes e níveis nutricionais).

Outro desafio é garantir a estabilidade e viabilidade dos MOOGs durante o período de shelf life de doze meses do alimento pet.

Em busca de contornar esses desafios, nosso grupo de pesquisa e desenvolvimento da Special Dog Company estuda há mais de 3 anos, através de parcerias e financiamento de projetos de pesquisa com universidades, diferentes maneiras de aplicação desses micro-organismos, bem como formas de viabilidade e sobrevivência dos mesmos sob diferentes condições de processamento e gastrointestinais simuladas in vitro; recentemente, através de parcerias, conseguimos viabilizar para nosso processo a proteção dos MOOGs através da técnica de microencapsulamento, que permite, por de suas camadas de revestimento, uma liberação direcionada ao intestino, através de um mecanismo pH-dependente. A primeira camada de revestimento é constituída por uma matriz de polissacarídeo que irá garantir a sua chegada ao intestino delgado. As demais camadas de revestimento são constituídas por outra matriz polissacarídica que atua através das propriedades de muco aderência, e por meio de uma liberação direcionada no jejuno (pH neutro). Conseguimos também viabilizar a aplicabilidade no processo produtivo, que foi comprovada através de resgates das unidades formadoras de colônias das bactérias láticas.

 

 

COAUTORA

Mariana Monti - Gerente de pesquisa e desenvolvimento da SDC.