O mercado pet continua aquecido. O consumo de pet food demandou mais de 2 milhões de toneladas de ração em 2019, de acordo com o Sindirações. Com a demanda por alimentos diferenciados e exigência por parte dos clientes, mobilizamos nossa cadeia de suprimento para poder atender aos nichos e colaborar trazendo um equilíbrio entre nutrição e bem-estar. 

No caso dos felinos, sabemos que são carnívoros e possuem o metabolismo com particularidades diferentes dos cães. Caçadores solitários, se alimentam em várias refeições por dia e são exigentes quanto à forma, crocância, sabor e cheiro do alimento.  A expectativa de vida da espécie está em 15,1 anos, o que significa que o interesse pelo bem-estar nesse tema, cresce. 

O termo bem-estar animal, por sua vez, está correlacionado a fatores, tais como: manejo clínico e do dia a dia “in home”, enriquecimentos (ambiental, cognitivo, sensorial, físico e alimentar) e, ao manejo nutricional. Antes do diagnóstico e tratativa, é necessário compreender esses aspectos para, então, realizar a recomendação nutricional específica baseada não só no indivíduo, mas no meio em que vive.

A era da clínica e nutrição geralistas já acabou. Portanto é função do médico veterinário, da primeira visita do felino até a senilidade, auxiliar na compreensão dos proprietários sobre os cuidados preventivos em cada fase de vida e na mudança gradativa que deve ser realizada no manejo, enriquecimentos e alimentação.

Particularidades do felino filhote

No caso dos felinos filhotes (do nascimento até seis meses de vida), até 45 dias estão desmamados e possuem rápida taxa de crescimento nos primeiros seis meses. Dos seis meses até um ano, podemos chamá-los de “Juniors” e nesta fase o crescimento já começa a se estabilizar. Durante o desenvolvimento, pelo fato de serem gliconeogênicos e os tecidos orgânicos estarem em crescimento, a demanda de proteína é alta e a alimentação precisa ser disponibilizada de forma livre durante o dia, ou no mínimo em 4x, utilizando-se da quantidade recomendada para cada 24 horas. Quanto ao manejo, a fase de sociabilização inicial  (Infância I) se dá da 2ª à 9ª semana, e é nessa fase que os filhotes devem ser gradual e positivamente acostumados com diferentes estímulos, barulhos, outras espécies, crianças, práticas de cortar a unha, limpar a orelha, escovar os dentes e habituação com caixa de transporte. Precisamos oferecer variados tipos de liteiras, para que o felino se sinta à vontade para expressar suas vontades de uso e, principalmente, introduzir diferentes opções de alimento para o peludo se adaptar a diferentes texturas.

No que chamamos de Infância II (8ª à 16ª semana), é importante realizar o controle parasitário, ensinar comandos, introduzir brinquedos, e, de acordo com o estado do indivíduo, decidir a melhor fase para castração. Para realizar os protocolos de vacinação, devem ser considerados os benefícios, riscos e ambiente em que vive. Não devemos estimular as visitas as clínicas apenas pela vacinação, e sim, pela necessidade de avaliação clínica e nutricional para cada fase de vida.

Particularidades do felino adulto

Essa fase se dá a partir de 12 meses, e tem como princípio básico alimentação para manutenção de escore corporal ideal, para evitar obesidade.  Com isso, precisa-se escolher o alimento adequado para a idade e nível de atividade, sendo fornecido com regularidade. Gatos adultos que vivem no interior dos lares necessitam de menor quantidade de macronutrientes quando comparados a gatos que vivem soltos, pois estes apresentam maior gasto energético.

Dieta úmida ou seca? Ambos os tipos de dieta podem propiciar saúde durante todos os estágios de vida. Os alimentos secos reduzem o volume das fezes, pois são concentrados em nutrientes e energia, porém podem levar o pet à obesidade se a quantidade não for controlada. Os alimentos úmidos, por sua vez, exigem cuidados no fornecimento, mas, apresentam menor densidade energética e ajudam os pets na manutenção do peso. Além disso, proporciona diluição da urina, auxiliando na saúde do trato urinário, evitando a formação de cristais. O ideal é que se faça um balanço, levando em conta particularidades do proprietário (estilo de vida) e paciente (consumo diário de água e predisposições).

Quanto ao manejo, gatos adultos domésticos são fiéis aos seus hábitos, mas mantém a fisiologia de um predador, logo, precisam ser estimulados à verticalização (tocas suspensas) para se sentirem seguros. Quanto ao número de liteiras, deve ser proporcional ao número de animais em casa + 1 e é importantíssimo que sejam colocadas em locais tranquilos, seguros e cobertos, e em ambientes diferentes da água e alimento. A liteira precisa ser lavada pelo menos uma vez por semana com detergente neutro e as excretas removidas diariamente. Por sua origem desértica, gatos apresentam baixa ingestão de água, sendo necessário estimular o consumo através da setorização (setor da água precisa estar separado dos demais setores: alimento, liteiras, das “plantinhas” e dos brinquedos). Em relação à vasilha de água, precisa ser ampla (evitando encostar as vibrissas nas bordas) e higienizada todos os dias.  Quanto de água meu paciente ingere? Esse dado precisa ser conhecido e para os peludos que têm baixa ingestão (< 15 mL/kg), outras alternativas precisam ser traçadas.

Particularidades do felino idoso

Os gatos são “maduros” entre 7 e 10 anos, “sênior” entre 11 e 14 anos e “geriátricos” a partir dos 15 anos. As fases possuem diferentes exigências e esse antagonismo fica evidente quando comparamos, o grupo tido como maduro, que possui maior incidência de obesidade, ao grupo dos geriátricos, que sofrem com caquexia. São doenças que demandam aportes nutricionais e ambientais distintos. Na fase sênior, os animais começam a perder peso, apresentam os primeiros sinais de redução da elasticidade e da capacidade de hidratação da pele e pelagem e redução da digestibilidade de gorduras e de proteínas. Na fase geriátrica, fica notável a perda de peso e de massa muscular, o comprometimento dos sentidos, a redução da imunidade e o surgimento de doenças. Trata-se de um processo natural de envelhecimento, mas é possível minimizá-lo pelo aporte nutricional e ambiental adequados.

O veterinário deve explicar aos proprietários o manejo realizado na fase jovem irá influenciar nas fases seguintes quanto às adaptações ambientais e dieta. As principais mudanças ambientais para felinos geriátricos incluem: a colocação de rampas para evitar o impacto dos pulos e que irão permitir que o animal mantenha sua rotina de brincadeiras, visando a manutenção da massa magra; não oferecer o alimento em locais que exigem que o animal salte ou que coma em posição arqueada; fornecer ambientes de descanso tranquilos com caminhas espessas e acolchoadas, para evitar lesões de pele e dores nas articulações; disponibilizar liteiras com entrada mais baixa para facilitar o acesso.

Nas fases sênior e geriátrico, o proprietário precisa estimular o aumento da ingestão hídrica; dieta com alto teor de ácidos graxos essenciais (w3 e w6 irão auxiliar saúde da pelagem, e o DHA estimula as funções cognitivas); dieta rica em antioxidantes (reduz radicais livres que ocorrem com o envelhecimento); dietas com ingredientes para o sistema imune (fontes de beta-glucanos, leveduras) e dieta com ingredientes com excelente perfil de aminoácidos (ovo em pó, glúten de trigo, isolada de soja).

Em resumo, existem particularidades para serem orientadas aos proprietários para cada fase de vida, levando em conta o individual. Não devemos subestimar o básico, ao contrário, garantir o bem-estar é tão importante quanto garantir sua nutrição. Essas duas necessidades estão correlacionadas positivamente e devem ser atendidas para garantir a prevenção de doenças e garantir longevidade.

Coautoras: Ma. Francine Peres, Dra. Katiani Silva Venturini

Referências

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