Do ponto de vista da indústria pet food, a sustentabilidade refere-se à administração responsável dos recursos e resíduos utilizados para suprir as necessidades fisiológicas dos animais de companhia, garantindo que as futuras gerações também possam atender às suas demandas ambientais, sociais e econômicas.

Existem possibilidades de aprimorar a sustentabilidade em todas as etapas do ciclo de vida dos alimentos para pets, desde a formulação e a escolha dos ingredientes até os processos de fabricação, uso de materiais para embalagens, métodos de transporte, redução do desperdício de alimentos e embalagens, além do descarte responsável dos resíduos gerados. A composição nutricional e a seleção de ingredientes são aspectos fundamentais no processo de formulação e fabricação de rações, podendo influenciar diretamente a sustentabilidade dos alimentos para animais de estimação. Nesse contexto, é possível aproveitar ingredientes originalmente destinados ao consumo humano, que mantêm qualidade e total conformidade com a legislação alimentar, mas que, por razões práticas ou logísticas, deixaram de ser utilizados para esse fim. Esses ingredientes podem ser incorporados à fabricação de ração para pets, contribuindo para a redução do desperdício. Um exemplo disso é o excedente de frutas, proveniente do processamento industrial de alimentos in natura, como a polpa de frutas, que agrega valor nutricional e fornece benefício à saúde dos animais, além de melhorar a qualidade do alimento.
Além da preocupação com a sustentabilidade, a indústria de alimentos para cães e gatos tem buscado cada vez mais promover a saúde e o bem-estar dos animais, além de suprir as necessidades nutricionais básicas. Nesse contexto, estudos vêm explorando a inclusão de ingredientes funcionais nas formulações de dietas comerciais. Dentre esses ingredientes destacam-se as frutas, que além de fornecerem benefícios à saúde, também remetem ao natural e às dietas dos tutores.
De forma inovadora, a melancia é uma das frutas que tem sido amplamente estudada em humanos e animais devido aos seus compostos bioativos, que apresentam propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes e podem modular a microbiota intestinal. Esses achados sugerem seu potencial em promover benefícios à saúde dos animais, evidenciando sua viabilidade como ingrediente em dietas para cães e gatos.

Melancia (Citrullus lanatus)
A melancia é uma fruta originária da África, pertencente à família Cucurbitaceae, e caracterizada por frutos grandes com polpa suculenta, doce e vermelha, de sabor refrescante e alto teor de água. Em geral, a melancia também possui uma variedade de nutrientes e compostos bioativos que podem ser benéficos para a saúde (Tabela 1). Contém açúcares como frutose, glicose e sacarose, apresentando baixos teores de proteínas e gorduras. Também é uma fonte de vitamina C e vitamina A (na forma de beta-caroteno), além de fornecer minerais como potássio e magnésio. Adicionalmente, possui compostos bioativos como citrulina, polifenóis e carotenoides, que exercem atividades antioxidantes e anti-inflamatórias.

PROPRIEDADES NUTRICIONAIS DA MELANCIA
O baixo teor de calorias a torna adequada para pets com necessidades calóricas controladas. Além disso, os compostos como polifenóis, licopeno, vitamina C e citrulina possuem ação antioxidante, e atuam neutralizando os radicais livres e outras espécies reativas de oxigênio (ROS), formadas a partir da atividade metabólica e da atuação do sistema imunológico. O acúmulo dessas ROS resulta em uma condição conhecida como estresse oxidativo, que pode causar danos celulares e é associado a doenças. Além de diminuir o estresse oxidativo, esses compostos também possuem capacidade de aumentar a atividade de enzimas antioxidantes endógenas. A citrulina, um aminoácido presente na melancia, é convertida em arginina, que é essencial para a produção de óxido nítrico. Este, por sua vez, melhora a circulação, atua como antioxidante e regula funções fisiológicas como pressão arterial e resposta imune. No entanto, seu excesso pode ser prejudicial, e a melancia também contribui para a eliminação de radicais de óxido nítrico.

Os compostos bioativos também atuam reduzindo a inflamação ao inibir fatores de transcrição (NF-B), enzimas reguladoras envolvidas na inflamação, e metabólitos pró-inflamatórios, além de suprimir a secreção de citocinas pró- nflamatórias. Isso é importante pois a inflamação é um processo biológico que ocorre quando há algum tipo de dano ao organismo (lesões ou infecções, por exemplo). Além disso, os mecanismos de inflamação também ocorrem em condições como alergias e doenças crônicas. Por isso é importante a incorporação, nos alimentos para pets, de ingredientes que possuem compostos bioativos com diversos benefícios ao organismo, assim como a melancia. Outro efeito interessante da melancia e seus coprodutos é o potencial em modular a microbiota intestinal, especialmente devido aos polifenóis, que estimulam o crescimento de bactérias com potencial benéfico e reduzem a abundância de bactérias potencialmente patogênicas. Estudos demonstraram aumento da abundância de Lactobacillus spp. e redução de Enterobacteriaceae, além do aumento de bactérias do gênero Bacteroides, da família Ruminococcaceae e de Akkermansia muciniphila, evidenciando a capacidade da melancia de induzir mudanças na composição da microbiota intestinal, auxiliando na manutenção da eubiose intestinal.

ESTUDOS SOBRE OS EFEITOS DO CONSUMO DE MELANCIA
Diversos estudos têm investigado os potenciais benefícios da melancia na dieta de humanos e de animais, destacando seu papel no combate ao estresse oxidativo e na modulação de respostas inflamatórias, como demonstrado no Quadro 1.

EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS DO IMPACTO POSITIVO DA MELANCIA NA SAÚDE DE CÃES
Embora haja uma escassez de estudos específicos sobre a inclusão da melancia em dietas para cães e gatos, pesquisas relacionadas à melancia indicam seu potencial na nutrição animal. Esses achados sugerem que a melancia pode ser explorada como ingrediente funcional em pet food.
Um trabalho realizado por Lima et al. (2025) investigou os efeitos da polpa de melancia sobre a digestibilidade da dieta, funcionalidade intestinal e resposta inflamatória e oxidativa de cães. O estudo constatou que a adição de polpa de melancia à dieta não afetou os coeficientes de digestibilidade aparente dos nutrientes, o que indica que sua inclusão é adequada e não comprometeu a utilização dos nutrientes pelo organismo. Da mesma forma, a microbiota intestinal manteve-se em eubiose.

Após 60 dias de consumo da dieta, embora não tenha sido observada diferença no marcador inflamatório avaliado, houve um estímulo no sistema antioxidante endógeno dos cães devido ao aumento da atividade da enzima glutationa-S-transferase (GST), menor peroxidação lipídica (LPO), e maior capacidade antioxidante total (T-AOC) (Figura 1). O aumento da GST e da capacidade antioxidante total sugere que a polpa de melancia auxiliou no fortalecimento do sistema antioxidante endógeno dos animais. Essa enzima protege as células do estresse oxidativo, enquanto a redução da peroxidação lipídica indica menor dano oxidativo às membranas celulares.

Esses resultados destacam o potencial da polpa de melancia em promover benefícios à saúde dos animais, evidenciando seu potencial de utilização nas dietas para cães e gatos.

AUTORAS:

Laiane da Silva Lima Zootecnista (UFPR), Mestre em Ciências Veterinárias e Doutoranda em Zootecnia com ênfase em nutrição de cães e gatos pela Universidade Federal do Paraná.
Ananda Portella Félix Zootecnista (UNESP/Ilha Solteira), Mestre e Doutora em Nutrição Animal pela Universidade Federal do Paraná. Pós-doutorado em Nutrição de Animais de Companhia pela University of Illinois at Urbana-Champaign. Atualmente é professora associada de Nutrição Animal, do Departamento de Zootecnia, da Universidade Federal do Paraná. Pesquisadora de nutrição de animais de companhia.

CO-AUTORES: Time técnico cientifico de Pesquisa e Desenvolvimento da Special Dog Company