A palatabilidade é primordial no desenvolvimento de um novo alimento, sendo um dos principais pontos que o consumidor consegue avaliar em sua própria casa. Mas quais são os aspectos que influenciam essa característica?

A palatabilidade de um alimento envolve muito fatores, sendo os principais: odor, sabor, formato, textura e a “sensação na boca”, também conhecido como mouthfeel (Pekel, 2020). A palatabilidade é primordial no desenvolvimento de um novo alimento, pois não adianta a dieta ser de excelente qualidade nutricional se ela não estimular o animal ao consumo. Além disso, a indústria está especialmente interessada na boa palatabilidade do alimento, pois é um dos pontos que o consumidor consegue avaliar na sua própria residência, muitas vezes levando-o a classificar o alimento como “bom” ou “ruim”. Gatos são espécies altamente exigentes em palatabilidade devido a suas características intrínsecas, como o paladar, a anatomia, a visão, o olfato, a apreensão e o comportamento alimentar (de Ratuld, 2021 – Diana Pet Food). Ainda no meio das diversas particularidades dos gatos, destaca-se o fato de serem insensíveis ao sabor doce, devido a uma deficiência de um dos genes que codifica para os receptores de açúcar - Tas1r3 (Li et al., 2006). Dentre essas características, o comportamento alimentar é o aspecto observado pelos tutores antes, durante e depois do consumo do alimento (Figura 1)

Figura 1: Respostas comportamentais em gatos durante os estágios de pré-consumo, consumo e saciedade. Retirado e adaptado de Pekel (2020).

Sabor - Formulação

O impacto na palatabilidade decorrente da escolha dos ingredientes utilizados nas formulações é extenso, além das diversas interações que podem ocorrer dentro da dieta. Porém, a literatura traz algumas ideias gerais que podem ajudar os nutricionistas a terem um ponto de partida. Quando pensamos nos ingredientes macros, a principal informação seria de que as farinhas de origem animal são, de forma geral, mais palatáveis do que as de origem vegetal. Mas a palatabilidade das fontes vegetais parece ser bem distinta entre elas. Podemos observar no estudo de Menolli (2016) o efeito de quatro principais fontes proteicas da dieta na palatabilidade de gatos. Foram avaliadas a farinha de vísceras de frango (FVF), farinha de carne e ossos 45% (FCO), farelo de glúten de milho 60 (GM60) e concentrado proteico de soja (CPS); as dietas foram formuladas com 35 a 40% da proteína teste (Tabela 1). A autora encontrou que os percentuais de consumo de dietas contendo FVF e FCO não diferiram significativamente para a dieta que continha CPS. Por outro lado, o GM60 não foi preferido quando comparado com as fontes de origem animal (FVF e FCO) e com o CPS (Tabela 2). A maior palatabilidade do CPS em relação ao GM60 pode ser explicada pelo maior teor dos aminoácidos lisina e arginina, e menor teor de fenilalanina e triptofano, que possuem sabor mais amargo (Pekel,2020). É comum encontrar produtos para gatos no mercado que possuem inclusão de lisina sintética na sua composição, na maioria das vezes com o intuito de aumentar a palatabilidade do produto, e não corrigir uma deficiência nutricional da formulação.

Tabela 1. Formulação das dietas utilizadas no estudo. Retirado e adaptado de Monelli (2016).

Tabela 2. Resultados de preferência de felinos por fonte proteica majoritária na dieta. Retirado e adaptado de Monelli (2016).

O estudo de Watson (2020) avaliou a palatabilidade de diferentes miúdos de bovinos e ovinos para gatos.  O estudo é interessante pois esses miúdos compõem a FCO, trazendo, portanto, mais um fator que pode interferir na variação de palatabilidade das FCO encontradas no mercado, cujas palatabilidades são frequentemente afetadas pelo processamento e grau de oxidação. Também é interessante para formulações de alimentos úmidos que costumam utilizar esses ingredientes em suas composições. No estudo realizado pelos autores, os gatos preferiram o fígado de bovinos quando comparado com pulmão, coração, rim, intestino e carne mecanicamente separada (CMS), todos de bovinos. Já para órgãos provenientes de ovinos, os gatos mostraram preferência pelo fígado e rim em comparação com os demais miúdos (Tabela 3). É importante destacar que o estudo ofertou uma quantidade menor de fígado aos animais (113,5g) do que dos outros órgãos (500g), já que o fígado possui uma quantidade elevada de vitamina A que limitaria sua ingestão do ponto de vista nutricional.

Tabela 3. Razão de ingestão de diferentes miúdos de ovinos e bovinos por gatos. Retirado e adaptado de Watson (2020).

Formato, textura e mouthfeel

Os fatores como formato, textura e mouthfeel possuem poucos trabalhos publicados, mas, como já citado, fazem parte dos componentes de destaque na palatabilidade do alimento. Estudos realizados pela Special Dog Company mostram que formatos mais arredondados são preferidos por gatos quando comparados a formatos mais pontiagudos ou irregulares (Figura 2).  A empresa também realizou diversos testes de rigidez dos kibbles ao longo dos últimos anos, e tem observado que produtos com rigidez alta (acima de 75 N/mm) parecem não ser apreciados por gatos. Além disso, já é bem estabelecido que a qualidade da expansão dos kibbles (influenciada pela formulação, formato, espessura e processamento) também é primordial para garantir a absorção de gorduras e palatabilizantes. Além de permitir a agregação de sabor de forma homogênea, a boa expansão irá permitir que esses compostos sejam exalados através das “bolhas de ar” de dentro para fora dos kibbles, tornando-os mais atrativos para o animal. A umidade final do produto também é um agente influenciador da palatabilidade do alimento, pois afeta diretamente sua rigidez e textura. Estudos demonstram que dietas com teores de umidade entre 4 e 5% tornam o kibble mais crocante, resultando em melhor desempenho quando comparado a dietas com 7 a 8% de umidade.

Figura 2. Impacto do formato na palatabilidade de gatos. Fonte: Special Dog Company.

Em conclusão, a palatabilidade dos alimentos é influenciada por diversos fatores, como a escolha dos ingredientes utilizados na formulação, a engenharia aplicada no desenvolvimento das matrizes, o processamento, a tecnologia de equipamentos utilizados na fabricação, as características da embalagem e o local de armazenamento do produto. Tendo em vista a complexidade das interações e seus aspectos, mais estudos são necessários nessa área para parametrização de valores de referência e melhor esclarecimento das variáveis na palatabilidade.

 

 

Referências:

Ahmet Yavuz Pekel, Serkan Barış Mülazımoğlu & Nüket Acar (2020) Taste preferences and diet palatability in cats, Journal of Applied Animal Research, 48:1, 281-292, DOI: 10.1080/09712119.2020.1786391

MENOLLI, K. A. P. (2018). Palatabilidade de diferentes ingredientes e aromas para gatos domésticos. Londrina-PR. 2018.

Li X, Li W, Wang H, et al. Cats lack a sweet taste receptor. J Nutr 2006; 136: 1932S-1934S

Watson, P., Thomas, D., Hoggard, A., Parker, M., & Schreurs, N. (2020). Investigating the Palatability of Lamb and Beef Components Used in the Production of Pet Food for Cats. Animals10(4), 558.

 

Coautoras:

Mariana Monti - Gerente de pesquisa e desenvolvimento da SDC.

Karine Santos - Analista de pesquisa e desenvolvimento da SDC.